Professor, Mentor e Criador: Sérgio Mascarenhas

Sérgio Mascarenhas


A Universidade é um poderoso instrumento de transformação educacional, cultural e social. Com este intuito, no fim da década de 1960, Sérgio Mascarenhas e outros colaboradores lutaram para criar um curso multidisciplinar, seguindo a linha da Física do Estado Sólido e da Física da Matéria Condensada. Desviou de diversos percalços burocráticos e críticas quanto à necessidade da criação de um curso que poderia ser “mais do mesmo”. No entanto, ao criar o curso e — nada mais, nada menos — a Universidade Federal de São Carlos (onde também foi reitor pró-tempore) provou ter uma visão e, acima de tudo, uma ação muito à frente de seu tempo. Com sua luta, criou o primeiro curso de Engenharia de Materiais da América Latina, desenvolveu uma das universidades mais importantes do país e sempre se mostrou um professor e, acima de tudo, um ser humano excepcionais.
Ontem, dia 31 de maio de 2021, o ilustre professor nos deixou. De forma a relembrar os principais feitos e contribuições do Prof. Mascarenhas, além de deixar registrada nossa gratidão pelas incontáveis contribuições à ciência e à sociedade brasileira, o Jornal A Matéria preparou esta nota de luto.

O legado do professor Sérgio também se faz presente fora da UFSCar. Dentre suas várias realizações, destacam-se as criações do Instituto de Física de São Carlos (IFSC/USP), do Centro Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento de Instrumentação Agropecuária da EMBRAPA e da Fundação de Pesquisas Adib Jatene. Também compõem esta lista inúmeros prêmios por seus êxitos, dentre os quais pode-se citar: Comendador da Ordem Nacional do Mérito Científico, Prêmio de Mérito Científico, na classe de Grã-Cruz (2002), Fullbright Award (EUA). Ademais, o prof. Mascarenhas recebeu o título de professor Emérito do Instituto de Física e Química de São Carlos (IFQSC/USP) e da Universidade Nacional do México, além dos títulos de doutor honoris causa pela UFSCar, em 2012 e pela UFPE, em 2013.
É importante pontuar que Sérgio Mascarenhas não se destacava somente como pesquisador, mas também como pessoa. Devido a seu prestígio no meio acadêmico - especialmente, dentro da UFSCar - a associação de ex-alunos do DEMa (DEMaEx) criou o Prêmio Sérgio Mascarenhas, realizado anualmente, no qual são agraciados o aluno e a aluna de destaque dentre os formandos de Engenharia de Materiais do Departamento. Além de comparecer pessoalmente a todas as cerimônias de premiação (com exceção da última, que foi feita de forma remota devido à pandemia), o professor Mascarenhas dava aos dois laureados um prêmio financeiro, tirado do próprio bolso. Suas participações na premiação sempre eram acompanhadas de uma solene palestra em que o professor falava sobre diversos assuntos: criação da UFSCar, importância da ciência para o Brasil, perspectivas futuras, e mensagens para a vida. Em especial, na edição 2020 do prêmio, um dos temas abordados foi o tempo - “O tempo é a grandeza de maior valor na vida humana. Hoje, com meus 92 anos, não consigo comprar tempo, por mais rico que eu pudesse ser. Mas eu posso passar o bastão. Vejo a Maria Gabriela e o Murilo Henrique (ganhadores do prêmio) e me sinto transportado, como num grande sonho, e percebo que essa integração de gerações é a essência do progresso”. [1]

Agora peço licença para o Eduardo, que escreve este texto comigo, e para meus colegas do Jornal para colocar um relato pessoal meu, como Augusto, que explicita bem a grandiosidade do querido professor Mascarenhas. Durante o ano passado, participei da organização da SEMa eXperience e aproveitamos o modo remoto para trazermos pessoas que possivelmente não conseguiríamos em um modelo presencial. Nesse sentido, a principal palestra — com todo o reconhecimento que as outras merecem — foi a do professor. Ele, mesmo acometido de uma gripe e de problemas auditivos, fez o possível e o impossível para gravar a palestra e, durante a live, entrar ao vivo para responder às perguntas dos ouvintes extasiados com a possibilidade de ouvir um mestre como ele. Não bastando isso, uma semana após, ele me ligou em meu celular simplesmente para agradecer a oportunidade, para perguntar sobre minha trajetória e meus planos e sonhos para o futuro. Sim, o principal responsável pela criação do curso que eu escolhi me ligando para me agradecer. Isso só demonstra a incrível capacidade que o Prof. Mascarenhas tinha de mudar as pessoas e o mundo à sua volta. Para finalizar, gostaria de deixar a principal frase que escutei em várias de suas palestras e que — acredito eu — muitos deveriam, também, seguir: “O professor que não tem alunos melhores do que ele falhou”.

É simbólico que o falecimento do professor ocorra em um período de demasiado sucateamento da Universidade Pública. Seguimos, inspirados pelo professor Mascarenhas, lutando pela educação pública de qualidade. Que a UFSCar e suas transformações na sociedade sejam, assim como ele, eternas.

O Jornal A Matéria, manifestando suas condolências, deseja muita força e paz à família e aos amigos do querido professor Sérgio Mascarenhas e estende os votos para que os seus corações sejam confortados neste período tão difícil.

Referências:
[1] Palestra do prof. Mascarenhas no prêmio Sérgio Mascarenhas 2020: https://youtu.be/I3X6rllxKFI