[22º EDIÇÃO] Curiosidades - The Witcher

Witcher1

        Lançada em 2019, a série da Netflix The Witcher, adaptação baseada na saga de mesmo nome do autor polonês Andrzej Sapkowski, foi considerada um dos maiores lançamentos de produção própria da plataforma de “streaming”. E com a divulgação, em julho, do trailer da segunda temporada que está por vir no final deste ano, os fãs aguardam ainda mais ansiosos pela continuação. Entretanto, essa não foi a primeira vez que os jovens ficaram fascinados pelo universo da saga. O primeiro jogo, que viria a fazer parte de uma trilogia também inspirada nos livros poloneses, foi lançado em 2007 e o terceiro jogo da sequência, que estreou em 2015, foi considerado um dos melhores “video-games” já feitos, ganhando inúmeros prêmios. Porém, do que se trata, afinal, a tão bem sucedida saga?

        A história se passa num mundo de fantasia medieval e acompanha as aventuras do bruxo Geralt de Rivia em sua caçada a monstros mágicos junto ao encontro de seu destino. Geralt, em sua jornada, carrega consigo duas espadas, sendo uma de aço e outra de aço revestido de prata. Esta espada revestida de prata, como é exposto nos livros, na série e nos jogos, é usada somente para combater criaturas sobrenaturais, quando apenas força bruta não é suficiente, de modo a sugerir que a prata é eficaz contra criaturas mágicas. Não é a primeira vez que o metal em questão é abordado nos folclores e histórias de fantasia com propriedades especiais contra monstros: lembremos das famosas balas, estacas e cruzes de prata inimigas de vampiros e lobisomens, por exemplo. Mas afinal, existe algum fundamento para a fama do material prateado? E seria possível uma espada inteira de prata?

        Lâminas e objetos cortantes são utilizados como ferramentas e armas desde períodos pré-históricos. Ao longo dos séculos, com a evolução dos materiais, a arte de forjar espadas também atingiu níveis superiores. Para a produção dessas armas é essencial que o material tenha elevada dureza, resistência mecânica, seja um material passível de ser moldado e seja leve, permitindo o fácil manuseio. As primeiras espadas eram feitas de cobre, mas devido à alta ductilidade e à natureza mole do metal, as armas se deformavam facilmente, o que não permitia que estas fossem muito longas. Foi na Era do Bronze, de 3300 a.C. até 1200 a.C., com a intensa utilização de ligas de bronze – cobre e estanho –, que apresentam dureza superior à do cobre, que espadas maiores e mais duráveis puderam ser feitas.

        Posteriormente, na Idade do Ferro, que se iniciou em 1200 a.C., surgiram as armas forjadas a partir do minério de ferro, o qual passava por um processo de refino conhecido como “bloomery” para se obter o ferro desejado. Este material apresentou ainda maior durabilidade em relação ao bronze. Porém, com o avanço tecnológico e, assim, maior controle da concentração de carbono presente na liga metálica, foram descobertas as ligas de aço — liga metálica ferrocarbono com até 2,11% de carbono — - que, com tratamentos mecânicos e térmicos corretos, vieram a se mostrar excelentes opções para a confecção de espadas, atingindo a dureza e resistência necessárias e possuindo maior resistência à corrosão e oxidação.

        A prata, em contrapartida, pertence ao mesmo grupo da tabela periódica do cobre, de módulo de Young em torno de 130 GPa [1], possuindo propriedades químicas e físicas semelhantes assim como uma elevada ductilidade e um módulo de Young ainda mais baixo, em torno de 70 GPa [1] Portanto, uma espada inteiramente de prata seria inviável considerando a finalidade da ferramenta.

        Embora a prata não apresente vantagem alguma em termos de propriedades mecânicas para uma aplicação que sofre impactos frequentes como espadas, este elemento apresenta uma propriedade bastante interessante, chamada efeito oligodinâmico, que é a capacidade do material de eliminar bactérias que possam estar presentes em sua superfície. Este efeito funciona da seguinte maneira: o metal libera íons que reagem com as proteínas da membrana celular das bactérias, resultando na desnaturação de enzimas , interrupção da proliferação celular e consequente morte da população microbiana.

        Não há confirmação em relação a essa interpretação nos livros ou na série, mas uma possível explicação (interpretação) para o uso de prata na espada dedicada a monstros mágicos do universo de The Witcher seria que essas criaturas podem apresentar uma biologia diferente da qual estamos habituados, sendo compostas por células similares às bactérias. E, sendo assim, a espada revestida com prata seria mais eficaz por, além de causar o corte e o impacto de cada golpe, também deixar resíduos de prata, como o próprio óxido de prata, formado a partir do contato da prata com o ar, nos ferimentos causados, não só dificultando a recuperação, como também causando a eliminação das células do monstro após o golpe.

        Além disso , recentemente, com a pandemia, essa propriedade da prata fez com que o metal ganhasse destaque por sua eficácia em combater inimigos nanométricos, os vírus. Estudos realizados por uma startup [2] de São Paulo em colaboração com laboratórios universitários mostraram que tecidos revestidos com micropartículas de prata foram capazes de inativar até 99,9% da carga viral. Mais um aspecto interessante para uma possível explicação para o uso da prata como material especial no combate a criaturas mágicas no mundo fictício.

        Portanto, embora não seja possível encontrar uma explicação baseada na ciência para o uso da prata em uma das espadas de Geralt, fora da ficção ainda podemos entender as aplicações e a importância deste metal nas áreas da saúde, higiene e no âmbito decorativo. 

        Referências: 

[1] CALLISTER, William D.; RETHWISCH, David G.. Materials Science and Engineering an Introduction. 9. ed. Hoboken: John Wiley & Sons, Inc, 2013. 992 p. 

[2] ALISSON, Elton. Empresa Paulista Desenvolve Tecido Capaz de Eliminar o Novo Coronavírus por Contato. 2020. Disponível em: https://agencia.fapesp.br/empresapaulista-desenvolve-tecido-capazde-eliminar-o-novo-coronaviruspor-contato/33414/. Acesso em: 19 ago. 2021.