[21ª EDIÇÃO] Pesquisa e Inovação: Professor Guilherme Koga

21ª edição - Koga 1

- Conte um pouco sobre você e sua trajetória.
        Sou natural de Guarulhos e ingressei no curso de Engenharia de Materiais em 2008. Naquele ano, para comemorar o 10° CECEMM, o evento ocorreu em São Carlos, onde tudo começou. Participei do minicurso sobre Metais Amorfos e Nanocristalinos, ministrado pelo prof. Claudio Kiminami. Ao final do evento, o procurei para perguntar se era possível iniciar uma IC no segundo semestre, e fui aconselhado a retomar o contato no segundo ano de graduação. No ano seguinte iniciei minha IC com o prof. Walter Botta, com a indicação do prof. Tomaz Ishikawa, já que o prof. Claudio Kiminami acabara de iniciar a sua gestão como Pró-Reitor de Pesquisa. A IC foi uma experiência incrível, e pude trabalhar com ligas de Ti-Si, ligas biodegradáveis de Mg-Ca-Zn e ligas Fe-Cr-Nb-B resistentes à corrosão e ao desgaste, estes dois últimos projetos com bolsa FAPESP, o que permitiu uma excelente complementação de renda. Pude operar e ter contato com equipamentos incríveis, mas o mais valioso foi a prazerosa interação com alunos, técnicos e professores, e as amizades que permanecem até hoje. Ao final do 7° semestre do curso, fui à Grenoble para a graduação sanduíche financiada pela CAPES-BRAFITEC, outra oportunidade que só pude ter com a política pública de fomento universitário e incentivo do DEMa e seus professores. Fiquei 01 ano na França, sendo 06 meses na Polytech (antiga Université Joseph Fourier) cursando disciplinas e 06 meses de estágio no LEPMI, laboratório de eletroquímica e físico-química de materiais e interfaces, com a orientação do profs. Ricardo Nogueira e Virginie Roche, trabalhando em produção de ligas ferrosas e sua corrosão, com forte interação com o DEMa, já que o prof. Botta estava naquele ano em Grenoble como professor visitante. Nesse período, tive a oportunidade de interagir com o Dr. Alain Reza Yavari e sua equipe, para a produção das ligas no SIMaP, laboratório de ciência e engenharia de materiais e processamento. Como a equipe do Yavari trabalhava no período noturno, ficava um expediente no LEPMI aprendendo eletroquímica (e treinando francês), e às vezes de noite no SIMaP para aprender processamento e metalurgia (e praticar inglês).
        Ao final da graduação, tinha predileção para a carreira acadêmica, e continuei no DEMa para o mestrado, investigando revestimentos ferrosos protetores, com orientação dos profs. Botta e Conrado, e valiosa colaboração com o Dr. Robert Schulz da Hydro-Quebec, Canadá. Como nunca tive experiência profissional na indústria, decidi buscar durante o mestrado um doutorado industrial no exterior, algo típico na França. Senti a necessidade pessoal de conduzir uma pesquisa aplicada, e expandir minhas competências em outras áreas através de um projeto multidisciplinar. Surgiu a oportunidade de ser contratado como Eng. de PD&I no grupo LafargeHolcim, empresa cimenteira, para conduzir uma tese em materiais, eletroquímica e engenharia civil sobre durabilidade de um novo concreto armado de baixa pegada de CO2 em seu centro de pesquisa em Saint-Quentin Fallavier, cidade próxima à Lyon. Lembrei de como os materiais cerâmicos eram também incríveis, recordando sempre das excelentes e memoráveis aulas de graduação e de pós-graduação do prof. Victor Pandolfelli. Decidi me aventurar, e foram três anos maravilhosos imerso no centro de PD&I da LafargeHolcim, aprendendo e me apaixonando por concreto & cimento com a Dr. Blandine Albert, com apoio em eletroquímica dos profs. Ricardo Nogueira e Virginie Roche, meus orientadores acadêmicos na Universidade Grenoble Alpes; metalurgia já tinha fundamentação da graduação e mestrado. Foi muito gratificante ver a banca de defesa representada por metalurgista, eletroquímico e engenheiro civil. Ao final dessa transformadora jornada, eu e minha esposa, já com saudades do Brasil e de nossos familiares, e eu do DEMa também, retornamos à nossa terra natal para continuar a nossa trajetória. Depois de um período de pós-doutorado no DEMa, passei no concurso para professor no local onde todas as oportunidades me foram abertas, e onde eu aprendi mais e tenho maior gratidão, sendo agora colega de profissão de meus mentores que tanto admiro, e de meus contemporâneos de graduação e pós-graduação, hoje docentes. Agora, minha principal missão é tentar retribuir um pouco o tanto que as agências de fomento, UFSCar, DEMa e professores me proporcionaram, e continuar seu legado em formar e dar oportunidades aos incríveis estudantes que são acolhidos anualmente em nosso curso de graduação e de pós-graduação. Também foco em auxiliar na interação entre universidade-empresa, participando com meus companheiros profa. Lidiane Costa e prof. Piter Gargarella no Centro de Caracterização e Desenvolvimento de Materiais (CCDM), sempre aprendendo muito com o prof. Claudemiro Bolfarini como sábio mentor e conselheiro.

- Qual é o tema de sua linha de pesquisa?
        O tema das minhas pesquisas é degradação e durabilidade de materiais, com enfoque em pesquisas multidisciplinares sobre corrosão e/ou desgaste envolvendo materiais ferrosos (aços e aços inoxidáveis) e materiais cimentícios (cimento e concreto).
        Na frente de aços, o intuito é desenvolver aços com propriedades tribológicas e eletroquímicas balanceadas, já que existe um paradigma entre tais propriedades dependendo da composição química e microestrutura resultante. Enfoque também é dado em assegurar propriedades satisfatórias para uma dada aplicação, com redução de custo através do controle microestrutural e composicional.
        Na frente de materiais cimentícios, o enfoque é na nova geração de matrizes cimentícias de baixa pegada de CO2 e de elevada competitividade econômica, tais como os cimentos sulfoaluminosos, os curados por carbonatação e aqueles que possuem elevados teores de adição de materiais cimentícios suplementares de subprodutos industriais. Trabalho na interface com a engenharia civil para dar um caráter de pesquisa multiescala, entendendo e correlacionando os aspectos macro e micro.
        O caráter multidisciplinar se caracteriza na testagem de tais materiais em condições reais, ou próximas da real, através de protótipos e desenvolvimento de instrumentação personalizada para a avaliação de desempenho. Com os resultados de campo e ensaios laboratoriais sofisticados e pontuais, é possível coletar elementos para uma melhor compreensão dos complexos fenômenos de degradação.

- Qual a motivação para esta pesquisa?
        A primeira motivação é que tanto o aço quanto o concreto são de longe os materiais de engenharia mais produzidos e consumidos no mundo, constituindo a espinha dorsal da infraestrutura moderna. No quesito de polivalência, balanço de propriedades e principalmente custo, poucos materiais conseguiriam atender uma população mundial em expansão, que já supera 7 bilhões de habitantes, devido à disponibilidade elementar da crosta terrestre (recomendo fortemente a todos ver a semelhança entre a composição elementar de um cimento Portland, e mesmo dos alternativos, com a crosta terrestre). Basta fechar seus olhos e imaginar se tudo ao seu redor constituído de concreto e aço desaparecesse. Pois é, provavelmente você estaria ao relento, sem vias para se locomover, sem dutos de água ou esgoto e sem energia elétrica também.
        A segunda motivação é que esses materiais se degradam por fenômenos complexos, ocasionando perdas econômicas enormes, riscos ambientais irreparáveis e acidentes graves (muitas vezes fatais). Grande parte da perda de desempenho e falhas de materiais metálicos e concreto armado é devido a corrosão, sendo o primeiro também grandemente afetado pelo desgaste.

- Quais são os objetivos?
        O objetivo é sempre assegurar projetos cada vez mais acessíveis, duráveis e seguros empregando materiais ferrosos e cimentícios. Para tal, é necessário não somente compreender o material, mas também seu entorno (aplicação), e desenvolver métodos de monitoramento e reparo, além de aprimorar normas e recomendações para prevenir falhas prematuras e catastróficas.

- Quais as possíveis aplicações?
        Inúmeras. O Brasil é um dos maiores produtores de minério de ferro, aço e cimento, além de ser um país populoso e de tamanho continental, porém com infraestrutura ainda precária, sistemas construtivos obsoletos e técnicas de monitoramento e reparo pouco difundidas. A economia do país depende fortemente da agroindústria, mineração, petroquímica e construção civil, os quais apresentam condições agressivas aos materiais empregados, majoritariamente aço e concreto. Neste sentido, é gritante a necessidade de uma visão e abordagem integradas de engenharia nesses setores, imprescindíveis para viabilizar soluções realistas e acessíveis, o que requer formação interdisciplinar, além da ciência dos materiais, mas também de eletroquímica (área da química), tribologia (área de mecânica), concreto (área de civil), custos (economia) etc.

- Existem desafios a serem superados? Se sim, quais?
        Realizar pesquisas aplicadas e inspiradas no uso, de cunho interdisciplinar e multiescala. Para tal, é importante ter a mentalidade aberta, e ter o desejo de permear outras áreas do conhecimento, tais como química, eletrônica, engenharia mecânica e engenharia civil, além de ir a campo e interagir com empresas e profissionais do setor produtivo.

- Há vagas de IC para a área? Se sim, existem pré-requisitos?
        Sim. Basta ter a mentalidade aberta à novas áreas do conhecimento, já que cada projeto exigirá interface com diferentes disciplinas.