[17ª Edição] Histórias do DEMa: Engenharia de Materiais na UFSCar Prof. José Eduardo Spinelli

Histórias do DEMa: Prof. José Eduardo Spinelli


Escrito por: Eduardo Bouhid e Giovanni Rosalino

        No começo do ano, o professor José Spinelli concedeu uma entrevista ao A Matéria para discutirmos (nós, Jornal, e vocês, leitores) questões que permearão os próximos anos da pós-graduação, uma vez que, este ano, o professor assume o cargo de coordenador do Programa de Pós Graduação em Ciência e Engenharia de Materiais (PPGCEM). Em meio a um cenário político que exige mais qualificação dos programas, mas, contraditoriamente, diminui os recursos para pesquisa, o professor entrevistado respondeu às perguntas com muita boa vontade, transparência e esclarecimento que, esperamos, sejam passados para vocês, leitores.

Você pode falar um pouco sobre sua trajetória até chegar aqui no DEMa?

Eu fiz graduação na Unesp de Bauru, antiga FEB (foi incorporada pela Unesp uns dois anos antes de eu ingressar). Lá, eu estudei Engenharia Mecânica e era bem interessante o convívio entre os alunos: existiam os cursos de Engenharia Civil, Elétrica e Mecânica e as turmas não eram muito grandes, cerca de 40 alunos cada. Na época, minha turma só tinha homens e eu era o único aluno de Bauru, mesmo.
A Engenharia Mecânica não tem muito foco em materiais, a maior ênfase nesse quesito é a parte de aços: estruturas em aço, tratamento térmico de aços, etc. Então, para mim, essa parte da Engenharia de Materiais veio depois, no mestrado e no doutorado. A Engenharia Mecânica tem, em geral, foco em usinagem, análises térmicas, cálculos de pórticos, estruturas, entre outros. Eu gostava bastante do curso, e a minha iniciação científica foi na parte de usinagem, avaliando diferentes tipos de rebolos para retificação. Eu sempre sonhei em estudar na Unicamp, prestei o vestibular para Engenharia Mecânica mas não conseguir passar lá. Depois de formado na Unesp, eu tive algumas oportunidades de emprego, mas não gostei muito. Então, eu resolvi tentar o mestrado, mesmo meus pais não estando muito a favor (risos), e consegui passar no processo de mestrado da Unicamp para retificação e usinagem, mas o professor não me aceitou porque já tinha um grupo grande - então eu fiz o mestrado com um outro professor, da área de fundição e solidificação de materiais metálicos e acabei fazendo o doutorado e o pós-doutorado com esse mesmo professor. Na verdade, isso não é muito recomendado, o ideal é ir trocando de instituição, mas depois eu consegui um pouco de experiência fora de lá.

Já que você fez o mestrado, doutorado e pós-doutorado na Unicamp, o que o trouxe até São Carlos?

Eu pretendia ficar lá, prestei o concurso e passei, mas não fui chamado. E, depois, as circunstâncias ficaram um pouco diferentes. Em 2008 eu estava na França, fazendo pós-doc com uma bolsa do CNRS (equivalente ao CNPq no Brasil), de 12 meses. Mas, depois de uns oito meses lá, minha família voltou para o Brasil por circunstâncias pessoais. Nessa época, também, tinham muitos campi sendo construídos no Brasil (o panorama era bem diferente de hoje [risos]) e, por consequência disso, tinham muitos concursos sendo abertos. Um pouco depois, eu voltei pra cá e prestei quatro ou cinco concursos, passei em três e fui pra UFRN, e assim minha família foi morar em Natal comigo. Porém, depois minha esposa passou em um concurso do Ministério da Agricultura, e ela tinha que assumir em Arealva, interior de São Paulo, então ela foi para essa cidade com a minha filha e eu continuei na UFRN - fui professor lá por dois anos. O nosso plano era continuar lá em Natal, mas para minha esposa ser transferida (essa questão para servidores públicos é bem complicada), precisava achar alguém de Natal que quisesse transferência para Arealva, o que era quase impossível. No meio disso, surgiu o concurso do DEMa, eu prestei e consegui passar. Logo depois, minha esposa conseguiu a permuta para São Carlos também, aí deu tudo certo. Somos dois parasitas, segundo o Ministro Guedes [risos].

Você pode nos contar alguma história que te marcou aqui no Departamento?

Uma história que me marcou positivamente foi a do Vítor Covre - um dos fundadores do Jornal. É com certeza uma história de sucesso, claro que ainda tem muito chão, mas pelo menos dentro do DEMa, pode-se dizer que deu muito certo. Eu gosto de contar porque várias coisas que ele fez me ensinaram muito também. Eu orientei 45 alunos da graduação já, nesses 9 anos de departamento, e ele fez 3 anos de IC comigo. Então, ele começou a falar do Programa Brafitec comigo e correu atrás, começou a aprender francês, etc. Depois de um tempo ele chegou à conclusão de que precisava melhorar o currículo para ser aceito no programa. Assim, ele foi fazer um estágio no CCDM. Finalmente, chegou a notícia da aprovação no Brafitec, e ele foi para França e ficou lá por dois anos. Passado esse tempo, ele voltou para fazer o TCC, e pediu para eu orientar ele. Eu sugeri alguns temas, mas ele já tinha uma ideia - um estudo sobre adição de Gálio em ligas Sn-Bi - e nós seguimos o plano dele! O Vitor fez - e defendeu - o TCC dele todo em inglês e ainda desenvolveu um artigo em cima desse trabalho. Nós submetemos esse artigo para uma revista conceituada em metais eletrônicos e a publicação ganhou um prêmio! Mais tarde, um grupo de Brisbane, na Austrália, que também tem projetos com Gálio entrou em contato, querendo colaborar conosco, mas o Vítor não foi para o mestrado - o que foi a única parte ruim dessa história (risos) - e foi trabalhar na Ericsson depois de concluir a graduação.

Como parte da coordenação do PPGCEM, como você enxerga o futuro da pós-graduação no Brasil e, sobretudo, no DEMa? Quais são os principais desafios?

A CAPES é o órgão que regula toda a pós-graduação, é ela que faz todo o controle, avalia a qualidade e indica as diretrizes para o futuro. Essa qualidade é aferida por vários índices, que incluem artigos publicados, cooperações internacionais, etc. Mas, atualmente, eles vêm procurando melhores índices, também, no fator humano: eles estão tentando estabelecer uma forma de calcular uma “taxa de sucesso” entre os alunos egressos - por exemplo, de 50 mestres e doutores formados há dois anos, quantos estão na indústria, dando aula, ou coordenando algum setor de pesquisa e quantos não estão atuando na área. Ainda não existe muita informação sobre como isso será medido, mas essa visão da CAPES mostra que eles não estão preocupados só com publicações. De que adianta publicar mil artigos se os alunos não estão sendo empregados em suas áreas? Particularmente, localizar todos os nossos ex-alunos é uma tarefa difícil para o DEMa, porque já formamos em torno de 1000 pessoas - mas, já temos uma estagiária aqui no PPGCEM que está fazendo esse levantamento, por meio de mídias sociais como o LinkedIn, por exemplo, porque no futuro a CAPES vai pedir essas informações para nós.
Além desse fator humano, é importante aumentarmos a visibilidade do nosso programa. Olhando os índices atuais da CAPES, nossa pior nota é no quesito de número de alunos dividido por número de docentes credenciados. Isso é porque temos muitos docentes e poucos alunos. Como não queremos nos desfazer de docentes, é preciso conseguir mais alunos. E é aí que vem a contradição, porque, quando se tem muitos alunos, é mais difícil entregar qualidade. É um desafio bem grande, conseguir trazer mais alunos e proporcionar a eles uma boa carreira, mas a coordenação está trabalhando bastante em prol disso.

Por fim, qual a importância da formação dos alunos na pós-graduação?

Eu, como orientador, cobro muito artigo, é uma característica minha. E é importante, pois você põe sua pesquisa para alguém avaliar. Eu digo também para os alunos irem atrás de docência, para darem aula. Tento fazer, no fim, que sejam equilibrados, mesmo porque você vai precisar fazer de tudo quando vira professor, apesar de que, claro, será melhor em algo específico. É muito difícil fazer tudo bem feito, sempre alguma coisa você vai fazer melhor. Então, acredito que a pós é o momento de você experimentar tudo. E se você, professor, não der oportunidade, o aluno acabará não experimentando.

[Texto retirado de nossa 17ª Edição, disponível em: bit.ly/EdicoesAMateria]