[17ª Edição] Entrevista com Vítor Covre: Graduado em Engenharia de Materiais pela UFSCar em 2018

Vítor Covre

Escrito por: Gabriela Mayer


Nesta entrevista, concedida ao Jornal A Matéria em março de 2020, Vítor Covre, graduado em engenharia de materiais pela UFSCar, fala um pouco sobre sua trajetória nos projetos dos quais participou e seus maiores desafios durante os anos de graduação.


Conte um pouco sobre você e sobre sua trajetória até chegar no DEMa, de onde você veio, como foi a escolha de curso etc.
Assim como todos que fizeram terceiro colegial em 2011, eu fui uma das pessoas que ouviu a frase “faltará engenheiros no Brasil”. Talvez de uma forma imatura, fui empurrado a pensar que faria sentido, pois gostava de matemática, física e química. Honestamente, poucas pessoas têm real noção do que querem nessa altura. Optei por prestar engenharia de produção. Passei em algumas faculdades, mas não na UFSCar. Ingressei na UFTM em 2012, na qual o curso tinha menos de 3 anos e uma infraestrutura em construção.
Aluno de federal não se surpreenderá, mas naquele mesmo ano houve uma grande greve dos professores e alguns professores da UFTM aderiram, mas não todos. Isso fez com que eu tivesse aulas de algumas disciplinas e outras não. Com uma ansiedade enorme de que queria ter ido pras faculdades que sonhava, ingressei num cursinho noturno e estudava nesses tempos livres. Cheguei a ter mais de 50 horas de aula na semana e revisava o caderno esperando o ônibus. No fim daquele ano, consegui todas as universidades que queria.
Já tinha feito matrícula na Unicamp e estava tomando trote quando passei na UFSCar. Claramente feliz, mas fiquei com dúvida se deveria largar a Unicamp, pois já tinha tudo arrumado. Pensei em ouvir duas pessoas, meu orientador no cursinho e o coordenador do curso na Unicamp. O primeiro me convenceu na famosa frase “É a melhor Engenharia de Materiais da América Latina”, como alguns dos que estão lendo talvez tenham sido também. O segundo, por um acaso, não encontrei. Porém, por coincidência, acredito saber sua opinião, pois essa pessoa se chamava Daniel Leiva.

Como foram seus anos na universidade? Conte um pouco sobre o que você fez durante esses anos, projetos dos quais participou, experiências marcantes que viveu. e quais foram seus maiores desafios durante os anos de graduação.
Nunca citei no meu currículo a experiência que tive no Aerodesign e mesmo que fui reprovado na empresa júnior. Poucas vezes na vida acertei algo de primeira, mas sempre aprendi muito com esses erros e algumas das coisas que aprendi com essas duas coisas me fizeram ser protagonista nas outras atividades que tive na faculdade. Além do Jornal e que realmente ajudei, fiz também parte da Enactus UFSCar e da organização do CECEMM. Em ambos aprendi muito, coisas até que usei depois quando fundamos o Jornal. Contudo, nenhuma dessas teve o apego emocional que tão significativo quanto à iniciação científica. Fiquei no antigo laboratório de soldagem por mais de 3 anos pesquisando com o professor Spinelli, tendo tido bolsas da FAPESP e dois artigos publicados. Apesar disso, os grandes aprendizados que tive desse tempo, poderia resumir em: tomar responsabilidade sobre seu resultado, aprender a viver o momento e a minha admiração pelo meu orientador.
Em diversas discussões sobre o que deveria ser mudado no curso de Engenharia de Materiais, ouvi que o curso era muito acadêmico e focava na formação de professores, pouco voltado ao que existe no mundo profissional. Porém, se engana aquele que pensa que uma IC não ensina sobre isso. Nada representa mais a vida profissional que se tornar responsável por um projeto, definir seus “entregáveis”, organizar dados, fazer análises e se tornar dono da qualidade e de tudo que aquilo representa. Mesmo hoje, na empresa, o dia-a-dia é nada mais do que se tornar responsável por questões similares, mesmo que o tema não seja aquele da sua IC.
Como estudantes, sempre estamos com os anseios das provas, medo de uma greve, muitas incertezas sobre o futuro, falta de dinheiro ou possível corte da bolsa. Por isso, as vezes as conversas nos corredores, enquanto carregamos caixinhas de amostras, acabam sendo permeadas de um tom um pouco negativo, e nessas e outras nos tornamos mais ansiosos. Contudo, não podemos esquecer de valorizar e viver mais intensamente os momentos com essas pessoas que aí estão momentaneamente. Tenho muitos amigos verdadeiros que me ajudaram intensamente nas conquistas acadêmicas que tive, discutindo um resultado, coletando um dado ou mesmo lixando amostra (grande demonstração de amizade para um engenheiro de materiais). E, por fim, dentro desse grupo de pessoas importantes se encontra o próprio prof. Spinelli por todo tempo e atenção que dispensou para mim.

Você foi um dos membros fundadores do Jornal e teve grande importância para o projeto. Como surgiu a ideia para a criação? Como foi o processo de criação do projeto? Como o Jornal contribuiu para seu crescimento pessoal e profissional?
O Jornal foi uma aventura realmente interessante e que me deixa muito alegre ver toda a continuação. A fundação se deu no contexto da minha candidatura com o Paulo para representação discente no CoD do DEMa em 2015. Há algum tempo ninguém fazia uma carta dos objetivos da gestão discente e nós fizemos, colocando alguns dos temas e objetivos que tínhamos discutido com amigos. Em certo instante essa ideia surgiu como um comentário do doutorando Bismarck, que me orientava, como algo que fomentaria discussões do que estávamos propondo.
Tínhamos o objetivo, então começamos, mesmo sem saber o que seria, a comentar com professores e convidar outros alunos. A cada vez que vendíamos a ideia, ela mudava um pouco. Porém, também ouvimos muitas coisas contra, que alimentavam a mudança, como que queríamos “copiar a Materiais Junior”, que isso já havia existido e etc... Mesmo assim, finalmente conseguimos algumas pessoas pra marcar uma primeira reunião e explicar a ideia.
Essa reunião foi ao meio-dia em maio de 2015. A foto desse dia estava até recentemente no mural do jornal no DEMa. Como uma anedota, eu tenho uma história particular sobre esse dia. Na parte da manhã, eu teria uma apresentação ao prof. Kiminami e uma entrega ao prof. Spinelli das correções do relatório da FAPESP. Dentro desse contexto, fiquei até tarde no DEMa na noite anterior até que tomei a decisão de dormir lá. Juntei algumas cadeiras no laboratório, mas estava desconfortável e decidi ir no Centrinho, dormir em um dos sofás. Ao abrir a porta, tomei um dos maiores sustos ao encontrar um dos guardas dormindo lá. Acabou que optei por voltar ao laboratório, que pelo menos tinha ar condicionado.
Naquela reunião, estávamos num ponto onde não sabíamos nada sobre como seria ou mesmo como fazer um Jornal. Contudo, é bom ver como, passo a passo, com pequenas contribuições de todos, as questões avançaram. Porém, vale destacar os grandes passos que marcaram os avanços no tema. Dentre essas, três grandes avanços e pessoas. O primeiro do Rafael Lazarini, que montou o modelo do Jornal como foi lançado, mesmo sem nunca ter feito algo do tipo. Além dele, a contribuição do Thiago Takamura com as ilustrações, logo e capa do Jornal. E, por fim, a do próprio Paulo Vinicius, que vendeu incessantemente o Jornal e conseguiu os primeiros 600 reais em troca de uma página nas próximas 4 edições. É interessante notar que não citei nenhuma grande contribuição minha, pois não houve na mesma maneira que a dos outros. Talvez a minha maior contribuição realmente tenha sido apenas manter as reuniões sobre o tema, evitar que o tema morresse, colocar uma meta de lançamento e acompanhar como podia aquilo que os outros faziam de melhor para que isso acontecesse.
Esse patrocínio de 600 reais veio do Laboratório Interdisciplinar de Eletroquímica e Cerâmica (LIEC), o que nos entristecia pois não tínhamos conseguido nada dentro do DEMa. Sendo assim, tomamos uma decisão ousada de fazer um grande lançamento do jornal. A ideia era que simplesmente chamar a atenção das pessoas de que algo estava acontecendo. Nada chama mais gente na faculdade do que “comida grátis”. E, dessa maneira, passamos a gravar vídeos dos professores anunciando o lançamento e chamando os alunos. Colocamos os 600 reais ali, arriscando dinheiro das próximas edições. Compramos impressões de adesivos e outras coisas com dinheiro próprio, fora a gasolina para buscar todas essas coisas. Todos naquele dia ajudaram a organizar alguma coisa. Ficamos ali, chamando gente laboratório por laboratório, até finalmente lotar o saguão. No auge da lotação, subimos na mureta e anunciamos o nascimento do Jornal, um pouco da maneira que acontece até hoje, como resultado de várias coincidências ao longo do caminho.

Você tem alguma mensagem que gostaria de deixar para nossos leitores?
A mensagem que gostaria de deixar, com base no jornal e na minha vida acadêmica é a seguinte: “Mire para o alto, atire a flecha e depois desenhe o alvo em volta de onde ela cair”. Como disse, eu vivi intensamente a faculdade, porém muitas vezes cheio de angústias com o futuro. Ainda hoje sofro com isso, mas me controlo ao pensar que a beleza do futuro é a incerteza de que tudo pode acontecer. Sonhava muito naquela época com a Villares/Arcelor Mittal, pois queria trabalhar na área e não consegui. Porém, não esperava, na época, que iria conseguir o duplo diploma pelo Brafitec, o prêmio Sérgio Mascarenhas, depois ser contratado como trainee de uma grande empresa e, recentemente, promovido em um cargo de coordenação. Sinto que o Vítor que tomou trote em 2013 teria ficado orgulhoso com o que realizou e talvez não teria desenhado o alvo em que hoje estou, pois ainda tinha muito o que viver. E assim, desejo o mesmo para todos que leem esse texto até aqui. Assim como no caso do Jornal, mantenha um objetivo grande e atue em cima dele, mas mantenha pequenos passos a cada dia pensando “o que eu quero com essa conversa e o que eu tenho que fazer hoje para isso avançar um pouco”. Por fim, não se assuste no final se o resultado for diferente do que iniciou, pois você também não será o mesmo daquele instante e agora já está mais próximo do alvo que irá chegar.
Muito obrigado a você leitor (a) pela atenção e à Equipe do Jornal “A Matéria” por continuarem fazendo isso acontecer.